Na manhã de domingo, 19 de Outubro, o Presidente da República de Angola, João Lourenço, partilhou nas suas redes sociais imagens de um passeio de bicicleta realizado em Luanda. Na legenda, escreveu:
“Pedalar, pedalar, pedalar… pela saúde! Muito cedo, este domingo, investimos na saúde física com um passeio de bicicleta. Foram 31 quilómetros, uma performance que nos deixa confortados!”
A publicação, partilhada inicialmente no Facebook oficial da Presidência e repercutida por órgãos como a TV Zimbo, tinha a intenção de promover um estilo de vida saudável. No entanto, gerou reações mistas — entre elogios e fortes críticas — nas redes sociais e na opinião pública.
Entre o exercício e a exibição
A imagem de um Presidente ativo e desportista pode, à primeira vista, transmitir vitalidade e espírito de liderança. Contudo, no contexto socioeconómico de Angola, onde a fome e a pobreza ainda afectam milhões de cidadãos, o gesto foi interpretado por muitos como uma demonstração de desconexão com a realidade do país.
De acordo com dados do Banco Mundial, mais de 40% dos angolanos vivem abaixo da linha da pobreza, e a desigualdade social continua entre as mais elevadas de África. Em zonas periféricas de Luanda e nas províncias do interior, o acesso a bens básicos como água potável, energia elétrica e cuidados de saúde continua precário.
Enquanto o Chefe de Estado pedala por avenidas asfaltadas, há famílias inteiras que caminham quilómetros diariamente para obter água ou para procurar trabalho informal que lhes permita comer uma refeição por dia.
O poder das imagens e o peso do simbolismo
Numa era dominada pelas redes sociais, cada gesto público de um líder carrega significados simbólicos profundos. As imagens do Presidente pedalando descontraidamente por Luanda, sem referência à crise económica e social do país, foram vistas por parte da população como um retrato cruel da desigualdade nacional.
O sociólogo angolano Carlos Alberto Viegas, citado pelo portal Novo Jornal, afirma que “a comunicação política em Angola continua a carecer de sensibilidade social. Quando um líder publica momentos de lazer num país em recessão, o gesto perde o valor simbólico e torna-se politicamente contraproducente.”
O contraste da realidade
Segundo o Instituto Nacional de Estatística de Angola (INE), o desemprego juvenil ultrapassa os 30%, e a inflação dos bens alimentares continua a reduzir o poder de compra das famílias.
Enquanto isso, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) posiciona Angola entre os países com baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), evidenciando a distância entre o crescimento económico e o bem-estar real da população.
O problema não é o Presidente andar de bicicleta — é fazê-lo sem perceber o contraste gritante entre o seu conforto e a luta diária dos cidadãos que governa.
O exemplo que se exige de um líder
A prática de exercício físico é saudável e deve ser incentivada em todos os níveis da sociedade. Contudo, um líder não se mede apenas pelos gestos que publica, mas pelas ações que transforma em políticas concretas.
Em vez de exibir percursos de lazer, o Presidente João Lourenço poderia promover um verdadeiro “exercício nacional” de combate à fome, ao desemprego e à corrupção — problemas que continuam a travar o desenvolvimento social e económico do país.
“A boa liderança começa quando o governante sente o peso do sofrimento do seu povo e não o disfarça com sorrisos fotográficos.”
— Comentário de um cidadão nas redes sociais, 19 de Outubro de 2025.
Conclusão: o país que precisa de movimento
Angola precisa, sim, de movimento — mas não apenas nas bicicletas do poder.
Precisa de movimento político, social e económico, que leve o país a pedalar na direção da justiça e da dignidade humana.
Enquanto uns pedalam por prazer, outros continuam a caminhar por necessidade.
E é nessa distância que se mede a verdadeira diferença entre governar e simplesmente ocupar o poder.
Fontes consultadas
TV Zimbo – Presidente João Lourenço percorre 31 km de bicicleta
Banco Mundial – Dados sobre pobreza em Angola
Instituto Nacional de Estatística de Angola (INE)
PNUD – Relatório de Desenvolvimento Humano 2024
Novo Jornal, edição digital de 20 de Outubro de 2025.


Enquanto o Presidente pedala, o povo caminha com fome
Por Paulo Muhongo
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POLITICA
10/20/20253 min ler